Paseo de Gracia

domingo, outubro 17, 2004

Odores

A minha mãe diz que sou uma cheirinhas e é verdade. Em honra do meu nariz sobredotado, capaz de reconhecer a marca de todos os perfumes das gentes que passam, resumo hoje a minha vida em cheiros, apetece-me recordar.
O primeiro odor é o da mãe, o perfume da mãe, o detergente com que a mãe lava a roupa, o cheiro a Cerelac, o cheiro a infantário (a sopa de infantário), o perfume francês da Néné (a terrível educadora de infância do "chorão"), o cheiro do pão com marmelada do colégio João de Deus, o cheiro dos chapéus de palha com os nossos nomes quando íamos brincar para o jardim... Há melhores recordações... o cheiro a Algarve, daquelas plantas de cheiro doce queimadas ao sol, aquele cheiro doce mais o odor dos eucaliptos é o conforto e a paz para mim... o cheiro a creme Nivea... São tantos que se calhar não vão caber. Outros... o cheiro a laca da minha avó, o cheiro daquele prefume que a minha tia Fáti gostava tanto, azul. O cheiro a sala fechada do quarto das visitas ou o da aletria do Sábado ao almoço, regada de canela. O cheiro da colónia johnson's da Mónica quando eu ia passar uma temporada a Miramar. O cheiro ao armário da minha madrinha, ainda agora me pergunto de onde virá - tudo vindo da casa dela tem esse cheirinho. O cheiro dos gatinhos quando estão ao sol e lhes faço festas. O cheiro da espuma de barbear do pai, do after-shave do pai, que ficava na minha cara o dia todo depois do beijo de até logo. O cheiro a lareira da casa do irmão do Pedra que se pegou às minhas pulseirinhas de fios, na altura em que fazia pulseiras e missangas. O cheiro do SAMS quando ia ao médico, o cheiro forte da Doutora Margarida, impregnada de perfumes. O cheiro da lama em Braga, aquele odor tão verde e frio que me magoava o nariz ao ir para a universidade. O cheiro das sardinhas assadas e dos pimentos no S. João, o maravilhoso cheiro do manjerico. O cheiro dos iogurtes da minha avó Isaura (estarei a confundir cheiros com sabores?). O cheiro do edredon de penas. O cheiro do ferro de passar a vapor e da roupa quente nas tardes em que lanchava com a Julieta e com a Rua Sésamo.

Hoje, os cheiros que mais me acompanham são banais... quase todos. O cheirinho da carro do Miguel, o cheiro a café na empresa, o cheiro abafado ao entrar no metro... Claro, há sempre o odor do meu Miguel, que reconheceria entre mil, mistura de cheiro pessoal com champô com amaciador de roupa com pele morena com perfume springfield... Encosto-me e já está, estou em casa sem precisar de chegar a casa.

Cheirinhos bons para todos e feliz Domingo.